Durante a guerra fria, além das ameaças de destruição, o mundo vivenciou aceleração de tecnologias. O uso de computadores se iniciava e os meios de comunicação se expandiam. União Soviética e EUA travavam o duelo para ocupar o espaço. Eu era ainda um garoto quando acompanhei o primeiro ser humano na lua através de uma transmissão via TV com imagens precárias em preto e branco. Aquilo ,de alguma maneira, me influenciou, não para ser astronauta, um operário do cosmo tão bem descrito pelo Elton John na música “Rocket Man”, refiro-me a encarar desafios que , para mim naquele tempo, eram construir uma nova rede de amigos depois que a família tinha se mudado para a pauliceia desalmada. Muitos entendem que os jovens precisam de disciplina imposta, pois eu digo que precisam de autodisciplina desde a primeira infância, aquela que brota da necessidade de se resolver um problema de acordo com a idade. Lembrei-me disso ao perceber os funcionários da Spacex vibrando, dias atrás, com o lançamento da Spaceship a qual, após um breve voo, teve de ser explodida por estar fora de controle. Estranhei terem comemorado mesmo quando a missão foi abortada. Talvez o feito da decolagem fosse suficiente ou quem sabe foi apenas um sinal da juventude atual acostumada a receber elogios vazios e exagerados. Detive-me, então, em analisar as imagens do centro de comando da missão, recheada de jovens com camisetas diferentes, muitos com bonés, tomando refrigerantes descontraidamente enquanto eventos importantes aconteciam. Quando do lançamento do foguete Saturno V, que levou a Apollo 11 até a lua, os controladores da NASA portavam camisas e cabelos semelhantes. Tensos, a maioria fumava compulsivamente, conforme relatos disponíveis na internet, e pareceriam até contidos com sucessos impressionantes obtidos então. Talvez essa imagem da década de 60 reflita a disciplina que então se impunha, um ambiente militar voltado ao conflito entre nações, um clima de medo. Vale destacar, também, a hegemonia branca, nítida nos cargos mais sensíveis ao marketing. Basta repararmos o perfil dos astronautas de então. Agora vivemos outra era. A diversidade seja nos traços, culturas, costumes e trajes, é o terreno comum onde as motivações dispensam o medo e brotam bem mais pela autodisciplina. Eu questiono seriamente os motivos dessa nova exploração do espaço, pois talvez seja um passo para um futuro abandono à grande espaçonave azul decantada por Caetano na música “Terra”, quando ele estava preso. Espero que não se esteja a privilegiar apenas o gene egoísta, desprezando o “útero” da natureza que nos gerou. De todo modo, vale lembrar, a inteligência e irreverência dos jovens nem sempre são afronta fútil às gerações anteriores e, sim, provocações evolutivas. Infelizmente alguns métodos antiquados ainda resistem, ou seja, ainda flagramos aqueles que preferem aplicar a força da disciplina, impondo padrões, controles e punições. Há tempos, acredito que líderes, incluso educadores, tratam os liderados demonstrando confiança ou medo. Quando confiam nos outros, agem generosamente, oferecem-lhes desafios, apoiam e avaliam. Mas, se sucumbem ao medo agem com egoísmo e covardia, tornam-se apenas algozes. As novas gerações são movidas muito mais por desafios . Se esses forem construtivos, a sociedade avança, mas também podem ser destrutivos, como o uso desvirtuado da internet, o abismo das drogas, os crimes e até a autodestruição. O futuro nunca é uma volta ao passado, teremos coragem para acreditar nele ?
Crônica de Carlos Lopes publicada no Correio Popular em 5 de maio de 2023