Labirinto da linguagem

Meio século atrás, os computadores eram enormes e disponíveis apenas em empresas, institutos de pesquisa ou universidades.  Os alunos de Exatas usavam cartões perfurados para alimentar um processador digital maior que um freezer e cuja capacidade era uma ínfima parcela de qualquer celular atual. Para aquele “dinossauro digital” fazer cálculos, era preciso utilizar alguma linguagem própria, uma série de comandos. A programação digital evoluiu muito desde então, mas, guardadas as proporções, não deixa de ser semelhante a escrever uma crônica: utiliza-se uma língua e um arranjo organizado de palavras de tal modo que os leitores entendam o raciocínio e possam interpretá-lo. Conforme Noam Chomsky, professor emérito de Linguística do MIT, o ser humano estrutura seus pensamentos através da linguagem e depois a utiliza como meio de comunicação. Essa linguagem pode ser visual, falada, escrita ou até gestual. Outros animais também se comunicam, alguns até com certa sofisticação e sem palavras. Entretanto, toda  comunicação sofre interferências. Há uma série de dificuldades, desde a estruturação do pensamento pelo emissor; a transcrição em palavras, imagens ou atos; a transmissão, e por fim, a decifração pelo receptor. Semelhante à programação de robots, os quais podem sair do controle com programação equivocada, nós, seres humanos, também saímos. Aliás, com o uso da inteligência artificial o potencial de ganho ou dano se intensifica. Pode ser que essa crônica que você está lendo agora tenha sido criada pela inteligência artificial. Como saber?  Ora, se a própria origem da mensagem nos gera dúvidas, o que não dizer de suas múltiplas versões? Por tudo isso, é cada vez mais arriscado confiarmos cegamente apenas em interpretações. Atualmente, há quem acredite em algo apenas porque muitos já replicaram ou simplesmente porque quem repostou é alguém conhecido. Pois bem, convenhamos, reenviar algo sem ter o mínimo indício de comprovação do conteúdo e sem refletir sobre as potenciais consequências desse ato é trair a confiança de quem recebe a mensagem. Somos cúmplices do que divulgamos. Quantas relações familiares, entre amigos e até países sofrem com essas perturbações, muitas vezes provocadas de forma dolosa e, ainda pior, quando lastreadas em alguma fé pessoal a qual nos convence, pelo orgulho, que somos os únicos escolhidos para proclamar as “verdades”. Se, por um lado, uma palavra de incentivo a um filho, aluno ou amigo tem o poder de melhorar a vida deles, interpretações distorcidas promovem rancores e ódio. Para bem se expressar, é preciso antes pensar muito, organizar a mensagem e assumir a sua responsabilidade.  Para compreender bem, é importante também refletir e ,se possível, ouvir, ler e entender outras fontes. Os meios de comunicação, inclusas as redes sociais, não podem ser um labirinto do qual a verdade não consegue sair. A propósito, essa crônica foi totalmente criada pelo ser humano nomeado abaixo. 

Carlos Roberto Lopes

crônica publicada no Correio Popular em 15 de março 2024